
MV - Existe algum objecto concreto por de trás das tuas criações artísticas? Se sim qual?
DB - Eu tenho a sensação de o que me faz fazer arte é primeiro um processo de auto conhecimento, é como se houvesse uma certa vivência no dia-a-dia e essas vivências acumulam-se e formam tipo uma bolinha de energia em que tenho uma vontade, uma quase necessidade de ter de fazer alguma coisa e que me sinta muito bem quando a acabo de a fazer. Mas os assuntos pelo que se calhar eu faço é porque eu desde pequenino sempre tive muita vontade de conseguir moldar a matéria ou de haver um plano mental onde eu realmente consigo moldar uma matéria mais subtil. Isso é, mais ou menos, o que tento fazer a nível de desenho. De resto, para mim, é sempre um desejo, um bocado libidinoso e sensual de haver um contacto com o trabalho que estou a fazer. É um bocado complicado explicar porque é como se houvesse uma parte de mim, ou um ser diferente em mim, que é um bocado mais desperto do que o normal, que eu costumo viver todos os dias, que naqueles momentos se manifesta. E eu faço também com o objectivo de depois me poder afastar do que fiz e levar isso como auto conhecimento. Acho que o meu trabalho tem muito a ver com a desconstrução do meu ser, com querer evoluir, chegar a um patamar em que já não evoluo só porque sou carregado de dúvidas, um natural que não é a minha consciência; claro q também me deixo levar por ela mas querer evoluir com consciência. Isso também tem muito a ver com o trabalho que estou a fazer que é desaprender as coisas e por achar que a arte é intrínseco a vida, não há barreira entre as duas coisas, até são capazes de ser a mesma coisa. Mas não tem que ter um objectivo, não tenho necessariamente que ir pintar ou desenhar com objectivo como se fosse sempre chegar a um culminar. É como algo que emerge continuamente que não tem de acabar nunca. Se a arte tiver um dogma ou um sítio para chegar desaparece como nós achamos que sentimos o que seja arte e, nessa mesma maneira, se eu tiver sempre a pensar o quê que vou pintar ou desenhar ou a música que vou fazer ou a letra q vou escrever deixa de ter sentido para mim porque é uma coisa que emerge, para mim. O que decidi é que vou entregar-me a uma coisa q eu não conheço, essa vontade q eu tenho, e admitir que talvez, aquele processo q eu não percebo vai-se tornando cada vez mais claro e acabar por ser coisas que são importantes para mim e que me ajudam como ser humano, no geral. Dai eu achar que a arte contribui grandemente para a evolução da humanidade e auto conhecimento.