Acerca de mim

Arte em Portugal - O desenho de David Bastos Trabalho Realizado por Manuela Vaz

sexta-feira, 23 de julho de 2010


David Bastos, aluno de artes visuais, tem actualmente algumas das suas obras expostas na exposição Andaime.Letrista, pintor, músico, desenhador, David é o que se chama de um artista completo.
Por ter visitado esta posição e ter ficado apaixonada pelas suas obras resolvi fazer o meu trabalho de arte sobre o David.

Na folha de sala de David Bastos, poderemos ler o seguinte texto, como explicação da sua exposição: "Existe um fluxo suficientemente volátil e suficientemente denso para ser moldado. O fluxo trespassa todas as coisas, existem em tudo como o campo das hipóteses moldáveis. Manifestasse emergido da mente, é a forma dos pensamentos que correm pelo rio da libido cujo trilho é resultado da sobreposição e interacção entre forças constantes. "Inconsciente" e "aprender" dissolvem-se na desaprendizagem consciente."

Biografia David Bastos


"Nasci as 19h e 15m do dia 15 de Julho de 1986 no Hospital Velho de Leiria. Vinha com o cordão umbilical à volta do pescoço. Deram-me o nome de David Joaquim da Fonseca Bastos.
Vivi numa casa no centro antigo da cidade.
Na infância passava dias a olhar para o jardim do senhorio. De vez em quando, talvez até mais regularmente do que me lembre, desenhava. Passava as tardes na cama dos meus pais a ver a cor do sol na minha cara com os olhos fechados ou então, a tentar ser o Karaté Kid.
À noite brincava com pedaços de barro.
O meu primeiro desenho emoldurado e exposto foi um auto-retrato que fiz, acho eu, quando tinha 4 anos.
O meu primeiro instrumento musical foi um metalofone. E panelas. Na primária toquei reco-reco e flauta. Aos 12 anos o meu pai ofereceu-me uma guitarra. Dois anos depois comecei a compor e, principalmente a escrever letras e poesia. Sempre escrevi mas é nesta altura que se torna realmente importante e regular. Entrei no liceu Francisco Rodrigues Lobo na área das artes e, em 2006, na UAlg no curso de Design da Comunicação. Um ano depois mudei para Artes Visuais. Ainda frequento o curso e ainda vou continuar a frequentar por mais um ano."

Depois de ir ver a falada exposição dos alunos de Artes Visuais da UAlg, falei com o David Bastos e tivemos uma conversa bastante agradável, na qual fiz-lhe algumas perguntas e de onde obtive respostas interessantes, como poderemos ver em baixo.
Manuela Vaz - Quando e como é descobris-te q tinhas um talento especial para as artes?

David Bastos - Eu acho que foi quando descobri que tinha vontade de o fazer. Não foi necessariamente só por as pessoas dizerem que eu fazia bem ou não, não era uma questão de recompensa. Muito disso era graças ao meu pai que muito me estimulou, desde pequeno, ele também faz arte. Eu lembro-me que a primeira coisa com que trabalhei foi barro, ele como fazia trabalhos com barro, dava-me um bocado enquanto estava a trabalhar para eu fazer os meus bonequinhos. Acho que me apercebi que queria seguir artes porque me dava muito prazer fazer aquilo é por isso, penso eu, que me consegui desenrascar melhor nas artes, por ter sempre esse estimulo da parte do meu pai.

MV - Lembras-te do teu primeiro desenho? O q era?

DB - Não sei se foi mesmo o primeiro mas é aquele que me lembro. Era um auto-retrato, acho que tenho a ideia de ter feito aquilo com 4 anos. Devo ter desenhado antes mas, aquele é o primeiro que eu considero ter feito desenho porque lembro-me da altura em que o fiz, lembro-me de estar a olhar e de desenhar na folha. Lembro-me de ter um espelho ao lado para ver a minha cara, acho que foi o meu pai que me estimulou ao dizer “faz lá um auto-retrato”. Desenhei-me com um fatinho com um colete, fiz uns sapatinhos bonitos e depois como a minha mãe é goesa desenhei por detrás uma ilha com uma casa de palha e uma palmeira. Mas achei isto muito simples, achava que não posso ser só isto, que aquilo não era o meu auto-retrato. Agora acho muito engraçado quando vou ver aquele desenho, que tenho no meu quarto em Leiria, que não me limitei só a desenhar como eu era a nível de imagem mas também o que achava que era a nível de interior, que era tipo um puzzle, queria me conhecer, então desenhei-me tudo cheio de riscos por cima, como se fosse um puzzlezinho, o meu auto-retrato.
MV - Quais são as tuas referências? Coisas que te influenciam?

DB - A primeira coisa q me vem à cabeça, das que mais me influenciam, é a música. O que mais vontade me dá para fazer arte, assim de símbolos exteriores, é quando eu vejo que uma pessoa é genuína ou que determinado acontecimento é genuíno, isso estimula-me a ir mostrar também, a tentar também ser genuíno. É isto que mais vontade me dá de fazer, é sentir esse estímulo, ou pelo menos o que mais me alegra no trabalho dos outros e que, como existe essa troca de energia semelhante alimenta a minha vontade de ir fazer arte.

MV - Qual o sitio onde mais gostas de trabalhar?

DB - O sítio que eu mais gostei de trabalhar foi o meu quarto. Preciso de um sítio onde o espaço que está a minha volta é mais ou menos um reflexo da minha personalidade, tenho que me sentir como se estivesse num casulo. Tenho que ter sempre alguns objectos, quase como talismãs, à minha volta, tenho que organizar o espaço de maneira a que me sinta bem, mesmo q esteja tudo organizado, tenho que ter, por exemplo, um incenso ou um objecto que eu caracterize como meu só para me sentir confortável. Mas tenho a sensação que gostava muito, e que quero fazer no futuro, de trabalhar mais dentro da natureza, sítios mais naturais. Gosto de sítios antigos também, casas velhas, também porque a minha casa em Leiria é uma casa antiga. Há dias que eu gosto de ir desenhar para o meio das pessoas ou para a rua, para a baixa de faro. Gosto muito da doca, apesar de não ir lá muitas vezes, mas é um sítio com que me identifico muito. Também há uns cafés onde gosto de desenhar como os Artistas ou o Pátio.
MV - O quê que te inspira?

DB - O assunto que mais me interessa é chamar a atenção da liberdade pessoal ou da potência humana da criatividade que infelizmente não é muito estimulada ou não é muito valorizada hoje em dia. É uma ideia muito humanitarista das coisas, uma vontade de transcender o nosso estado actual, isso são realmente os assuntos que mais me interessam.

MV - Existe algum objecto concreto por de trás das tuas criações artísticas? Se sim qual?
DB - Eu tenho a sensação de o que me faz fazer arte é primeiro um processo de auto conhecimento, é como se houvesse uma certa vivência no dia-a-dia e essas vivências acumulam-se e formam tipo uma bolinha de energia em que tenho uma vontade, uma quase necessidade de ter de fazer alguma coisa e que me sinta muito bem quando a acabo de a fazer. Mas os assuntos pelo que se calhar eu faço é porque eu desde pequenino sempre tive muita vontade de conseguir moldar a matéria ou de haver um plano mental onde eu realmente consigo moldar uma matéria mais subtil. Isso é, mais ou menos, o que tento fazer a nível de desenho. De resto, para mim, é sempre um desejo, um bocado libidinoso e sensual de haver um contacto com o trabalho que estou a fazer. É um bocado complicado explicar porque é como se houvesse uma parte de mim, ou um ser diferente em mim, que é um bocado mais desperto do que o normal, que eu costumo viver todos os dias, que naqueles momentos se manifesta. E eu faço também com o objectivo de depois me poder afastar do que fiz e levar isso como auto conhecimento. Acho que o meu trabalho tem muito a ver com a desconstrução do meu ser, com querer evoluir, chegar a um patamar em que já não evoluo só porque sou carregado de dúvidas, um natural que não é a minha consciência; claro q também me deixo levar por ela mas querer evoluir com consciência. Isso também tem muito a ver com o trabalho que estou a fazer que é desaprender as coisas e por achar que a arte é intrínseco a vida, não há barreira entre as duas coisas, até são capazes de ser a mesma coisa. Mas não tem que ter um objectivo, não tenho necessariamente que ir pintar ou desenhar com objectivo como se fosse sempre chegar a um culminar. É como algo que emerge continuamente que não tem de acabar nunca. Se a arte tiver um dogma ou um sítio para chegar desaparece como nós achamos que sentimos o que seja arte e, nessa mesma maneira, se eu tiver sempre a pensar o quê que vou pintar ou desenhar ou a música que vou fazer ou a letra q vou escrever deixa de ter sentido para mim porque é uma coisa que emerge, para mim. O que decidi é que vou entregar-me a uma coisa q eu não conheço, essa vontade q eu tenho, e admitir que talvez, aquele processo q eu não percebo vai-se tornando cada vez mais claro e acabar por ser coisas que são importantes para mim e que me ajudam como ser humano, no geral. Dai eu achar que a arte contribui grandemente para a evolução da humanidade e auto conhecimento.
MV - Qual o artista que mais admiras?
DB - Eu não tenho artista favorito. Também não é que realmente tenha procurado muito. Houve alguns que dei em aulas com os quais senti semelhança, tínhamos objectivos em comum como Joseph Beuys, James Turrell.
Também não quero criar a ideia de ter um artista favorito, acho que isso não ia fazer muito sentido e esses artistas em questão, provavelmente não são artistas que desenvolvam arte no mesmo campo que eu. Mas há muitos, há músicos, há bandas, há poetas… Houve um senhor que me estimulou muito mesmo, é o vocalista de uma banda chamada Incubus, Brandon Boyde. Nunca achei q me quisesse exprimir num só campo artístico, a música sempre foi aquele que achei que era mais presente e natural em mim, nunca tive formação musical, é tudo associado ao que me chamou mais. E o Brandon Boyde fazia vários tipos de arte, tanto pintava como desenhava, como escrevia ou cantava. Quando comecei a pesquisar mais as coisas que ele fazia achei semelhanças em vontades comuns. Devia ter uns 14 anos e saber que havia outra pessoa, que era mais velha, que tinha essa expressão artística mais consolidada, que já fazia, já era conhecido, deu-me força para querer fazer a mesma coisa, até então não tinha conhecido mais ninguém assim.

MV - É a primeira vez que as tuas obras são expostas? O que sentis-te?

DB - Não é a primeira vez que eu tenho trabalhos numa exposição mas, é a primeira vez que eu acho que é mesmo o meu trabalho individual. O meu pai também fez exposições quando era mais novo e lembro-me de, por exemplo, esse desenho que disse do auto-retrato ter sido exposto numa exposição. Mas não considerei isso uma exposição minha, eram exposições colectivas, tinha um trabalho ou outro, e isso era mais um treino artístico. Agora é que considero que esteja a fazer mais arte aquilo não era realmente. Por isso sim, é a primeira vez que estou a expor os meus trabalhos a uma escala maior. É uma sensação de orgulho mas não é um orgulho egoísta. A sensação que me d eu foi que “ já viste tens muitas coisas para fazer mas ao menos já começas-te a fazer”. Então é uma sensação que nos obriga quase a ser humildes. Dá muita energia ver que consegues ver o trabalho feito e afastar-te do trabalho, poderes observar e deixar que outras pessoas interpretem. Eu lembro-me que estava em pulgas no dia da inauguração da exposição porque ia ter finalmente pessoas a conhecerem-me. Mesmo que isto pareça uma coisa um bocado egoísta, acho que todos os artistas têm uma grande vontade que o resto das pessoas conheçam o que eles tão a fazer, não no sentido de terem de impor o seu trabalho ou a sua visão sobre o mundo, mas querem partilhar aquilo e saber a opinião das outras pessoas, com a esperança de que algumas gostem. “
MV - Como é que imaginas a tua vidasem arte?

DB - Essa pergunta fez-me pensar muito, porque eu acho que a minha vida só existiria sem arte se eu não tivesse vontade de o fazer. Há aquela ideia que eu poderia dizer “ok a minha vida sem arte devia ser alta porcaria e eu preferia morrer”, isso parte do conceito que eu então conhecia o que era arte mas não a fazia e acho que a melhor maneira de não a fazer seria não a conhecer ou não ter vontade para a fazer, porque se eu não tivesse vontade de a fazer se calhar não era tão infeliz porque nem sequer a queria fazer, mas também, poderia não ser tão feliz como sou agora. O que quero dizer é que, como nasci humano obviamente vou ter de fazer arte. Portanto não consigo imaginar a minha vida sem arte.

MV: Como é que achas q a arte em Portugal é vista?

DB: Por mim não é vista. Eu perco muito porque não costumo ver arte, não costumo pesquisar muito por isso não tenho uma opinião. Já vi coisas portuguesas mas a minha opinião não esta suficientemente formada para conseguir responder de maneira produtiva.
MV - Achas que os jovens deste novo século, elevadamente tecnológico ainda se interessam por arte?

DB - Eu acho que é um bocado vago estar a dizer jovens porque eu vou tentar introduzir todas as pessoas que são jovens agora e existe vários grupos dentro deles, e também não acho que seja o facto de estarem ligados ao factor tecnológico que os faz distanciar da arte porque arte já há, acho que tudo o que existe é possível ser feito com arte. O que acontece é que se calhar essas coisas são um bocado distractivas para o desenvolvimento deles. O que eu vejo nas pessoas mais novas do que eu ou da mesma idade é que, às vezes, há uma falta de interesse muito grande, nunca se envolvem num assunto a sério. Consigo reparar que têm muitas coisas dentro delas que são importante e que realmente se importam individualmente com as coisas, se calhar num nível mais profundo mas, mesmo sozinhas, se calhar não pensam tanto nisso. Mas, no fundo, importam-se mesmo e, até acho que têm capacidades muito mais vastas e têm a possibilidade de concretizar as coisas mais rapidamente do que gerações anteriores. Mas perdem porque, se calhar, criam uma camada social como distracção ou tentam criar uma imagem fixe na sociedade, o que faz com que em vez de se juntarem as pessoas sendo sinceras e individuais com um objectivo comum, um bem-estar geral, e dai perceberem que podem participar directamente na evolução da humanidade, criam facetas sociais só para se inserirem socialmente. Mas isto é algo que acontece desde à muito tempo mas agora é cada vez mais alarmante, está tudo mais facilitado e não é aproveitado, o que me entristece um bocado.

MV – Por fim, o quê que achas que é arte?

DB - Para mim como a arte sempre se manifestou de uma maneira muito directa se eu tiver algum propósito de vida é única e exclusivamente fazer arte. Eu acredito que a arte é um sinónimo de vida. Não consigo ver distinção entre estas três coisas arte, amor, vida, para mim, na minha cabeça, na maneira como experiencio é tudo no mesmo sentido. A arte, parece-me a mim, que agora é a única maneira ou aquela que melhor faz a ponte entre o nosso estado actual e a possível evolução da humanidade. Também acho que arte é aquilo que nos distingue completamente do resto dos animais, o que nos faz ser muito especiais, porque nós temos vontade de criar e parece que criamos coisas além da nossa natureza, os animais não fazem nada além da sua natureza. Isto também contribui para as coisas melhores que os homens podem fazer mas também para as maiores depravações, se calhar um leão não vai comer quando não tem fome, um humano é capaz de fazer isso; parece que fazemos coisas que vão contra a nossa natureza. Com a arte tu fazes um bocado isso, vais tentar falar de assuntos que são extra o teu tempo de vida e as tuas capacidades físicas é como se nós não viéssemos só daqui, é como se tivéssemos alguma coisa mais que quiséssemos expressar. Além de eu achar, obviamente, que a arte é um meio de expressão, que permite fazer com que haja continuidade nas coisas novas, muitas vezes o assunto é o mesmo entre várias pessoas mas elas querem mostrar essas mesmas coisas de maneiras diferentes. Há também, evidentemente, factores sociais, a arte conforme sociedade manifesta o que vai na cabeça das pessoas. A arte não só reflecte o estado de como nós estamos pois nós não olhamos para ela apenas como se fosse uma coisa fora de nós, olhamos também para ela para ver como nós somos.